O mês era Julho, um tempo de
uma seca que prometia ir longe, não se via uma nuvem nos céus que desse ao
menos uma esperança ou uma indicação que prenunciasse mudanças no tempo, aquelas
que os povos e os animais tanto esperam! Uma chuva! Que ela amenizasse o calor
sufocante, além de fazer os cursos d’agua aliviarem, pois diminuíam a cada dia
que passava. As pastagens dava pena ver, quase todas secas, alguns fiapinhos
verdes de pastos nos lugares mais baixos. As arvores perdiam suas folhas a cada
abanada de vento que dava. Uma situação terrível, principalmente para os
animais. O pequeno chacareiro imaginava como fazer para dar pasto aos seus
bichos. Teve uma ideia brilhante,
venderia os bezerros, vacas, cavalos novos deixando só um para sua montaria. E
aquele cavalo velho que possuía há tantos anos e que lhe servira todo este
tempo? Ah, já sei! Vou soltá-lo campo afora, sairá por ai sozinho a defender a
vida pastando onde tiver recursos, ninguém naquela época tinha tantas cercas de
arame farpado a ponto dos animais ficarem privados de andar ou entrar onde
quisesse. Também não sofriam maus tratos por ninguém, eram tempos de ouro para
todos os viventes. Assim fez, o cavalo velho saiu mundo afora contando com a
sorte que Deus podia lhe dar, andou por muitos dias até chegar num lugar muito
distante dali, já era de tarde, sentiu o cheiro de palha de milho verde numa
casinha a beira da estrada, aproximou e logo viu um velhinho sentado na
biqueira da casa a pitar um cigarro de palha. Foi chegando, chegando até parou
alguns metros do ancião. Este levantou e
estendeu a mão para o cavalo num gesto de dar-lhe algo para comer, o cavalo
gostou, cheirou a mão do velho e relinchou de contentamento. O ancião entendeu
que ele trazia fome, deu-lhe algumas palhas de milho verde que tinha num saco
dependurada na parede. O cavalo comeu satisfeito. Enquanto comia o velhinho
acariciou seus pelos no lombo, nas espáduas, no pescoço, na testa, na anca, no
rabo, rodeou-o, e viu que era mansinho. Gostou dele, pensou consigo! De quem
será este animal! Ah! seja lá de quem for, vou cuidar dele, vendo-o tão magro,
as costelas e quadris mostrando os ossinhos, já idoso e naquela situação, teve
pena! Acabando de comer, deu-lhe agua num coxo de lixeira que estava embaixo de
uma arvore de nome sete-copas, sorveu o liquido com satisfação, lavou a boca,
deu um relincho de agradecimento. Os dois se entenderam e o cavalo ficou por
ali no terreiro, aguardando o anoitecer. Deitou-se, espojou de um lado para o
outro, para tirar a canseira da viagem, esticou a vontade ficou abanando o rabo
fazendo poeira no chão. Ficou querendo o velhinho saber o nome do cavalo, mas
como? Chamou de vários nomes mas, ele não atendeu por nenhum. Ai o cavalo
disse-lhe: O meu nome é Castanho, se o senhor quer saber! O velhinho espantou
vendo-o falar na linguagem dos humanos. Respondeu: É mesmo? Sim, retrucou o
animal! O meu dono mora muito longe daqui, soltou-me campo afora porque lá não
tinha mais capim para a gente pastar. Lá pras bandas donde vim está uma seca
danada. Deu-me a liberdade de correr o trecho por onde eu quisesse. Por isto
cheguei até aqui. Sou muito idoso por isso não se importou em me soltar. Se o
senhor não se aborrecer ficarei por aqui contigo, não tenho morada mesmo! Nisso
o velho ouviu uma bagunça de macacos lá na beira da mata, saiu correndo para
ver, levou a espingarda para assustar o bando de micos, mas estes o viram e
saíram dali, fugiram todos do ancião. Dando muita risada do velho, a macacada.
Ele voltou aborrecido porque os macacos viriam mais tarde surpreendê-lo. Quem
sabe até a boquinha da noite, era uma roça de milho já amadurecendo de cujas
palhas o cavalo tinha comido horas antes. O animal vendo o velho aborrecido,
indagou o que lhe fazia triste. Ele respondeu: Estes macacos não me dão paz um
dia, se eu deixar, eles acabam com minha roça de milho. É uma trabalheira
danada, bichos safados, ás vezes sou obrigado a sair de madrugada para vigiá-los
senão comem todo o meu milho. Já nem sei o que fazer mais! Nem durmo direito.
Todos os anos é essa amargura! Porque o senhor perguntou? Disse o velho! O
cavalo velho respondeu: Posso lhe fazer uma proposta? Sim! Diga! Disse o
velhinho! Ouça bem, retrucou o cavalo: Vou vigiar este bando de macacos para o
senhor, não deixarei nenhum comer uma espiga de milho. Nenhuma sequer! Te
garanto que, colherá todo seu milho sem prejuízo algum! Está bom? E quanto me
cobrará pelo serviço? Perguntou o velhinho todo animado! Basta que me dê todos
os dias, uma ração, agua fresquinha e um cantinho para mim descansar nas horas
de sol muito ardente, disse o cavalo velho. Está feito, disse muito esperançoso
o caboclinho. Podes começar amanhã, se quiser! Esta noite já vou dormir bem,
pois ando muito cansado e sonolento! Anoitecendo foram os dois descansarem, um
com o bucho cheio de palhas fresquinhas de milho verde, e o outro de arroz com
feijão e carne seca na polenta, bem cozida. Logo na madrugadinha o cavalo foi
para a roça, deitou-se no chão bem no lugar onde os macacos desceriam. Lá ficou
quietinho, de olhos fechados como se estivesse morto. Até as aves de rapina,
urubus e carcarás começaram chegando e pousando nos galhos das arvores ali
perto, pensando estar morto o cavalo. Assim que os macacos chegaram, viram o
cavalo, um deles gritou para o chefe: Só faltava essa, logo onde a gente vai
almoçar aparece um cavalo morto, já está fedendo, funnn! Funnn! Que catinga
horrível! Desçam todos e vamos tirar esta carniça daqui, tem que ser logo, Pera
aí, disse o chefe: Arranje uns cipós para a gente amarrá-lo, depois nós arrastaremos
daqui esta coisa fedorenta. Um bem-te-vi, lá no galho vendo aquilo tudo,
avisou: Este cavalo está vivo! Tá vivo! Este cavalo está vivo! O carcará deu
sua opinião, crá, crá e crá! Para saber se está vivo? Bica lá naquele lugar!
Crá crá crá! Bica lá que tu verá? Não pegue nele senão bicá! Mas os macacos nem
se importaram com o aviso das aves.
Todos amarraram os cipós no cavalo para tudo o que era canto, no pescoço, no
rabo, nas pernas, pelo meio, nas paletas e todos os macacos também foram
atados, pela cintura, pelo pescoço, nos punhos, nas pernas para que fizessem
força todos parelhos, bem unidos assim: Um, dois, e Já! Quando moveram o cavalo
do lugar: Este cavalo levantou e saiu numa carreira doida, arrastando tudo o
que era macaco e pulando e dando coices passando por cima de tocos e troncos
caídos, relinchando, peidando e assoprando as ventas, parecia um furacão. Só
via pedaços de macacos para todos os lados, uns sem cabeça, outros sem braços e
pernas, outros cortados pelo meio, cabeças quebradas porque batera num toco outros
destripados, foi um arraso, morreram quase todos, só escapou alguns que estavam
coordenando o serviço para retirada do cavalo morto, assim mesmo andou levando
uns tombos e patadas porque o cavalo não escolheu direção para ir quando se
levantou. Passando por cima de tudo o que havia pela frente, entrou mata adentro,
quando não tinha mais nenhum macaco vivo, parou! Só se ouvia os bem-te-vis
gritando: Bem-que-eu-vi! Bem-que-eu-vi! Naquele reboliço que o cavalo aprontou,
não se viu nenhum carcará. Sumiram todos. O cavalo olhando por onde tinha
passado, parecia que foi um terremoto, um desastre nunca visto, só macacos
mortos. Assuou as ventas, e seguiu para casa devagarinho mas contente, missão
cumprida! Chegou na casa sujo de terra e sangue, marcado nos pelos arrepiados
dos cipós amarrados, sorrindo baixinho. O velho vendo-o naquelas condições quis
saber o que havia acontecido. O cavalo nada disse! O velho curioso foi na roça
ver, ficou abismado com o que viu! Nunca mais apareceu um macaco sequer para
incomodá-los. Nem sequer imaginara que o seu novo amigo fosse capaz de tal
façanha. Cuidou dele até o fim de sua vida.
HISTÓRIAS QUE CONTAMOS PARA CRIANÇADA SE
DIVERTIR.
CULTURA CABOCLA QUE PASSA DE GERAÇÃO EM
GERAÇÃO.
LUIZÃO-O-CHAVES....07/11/2013 ANASTACIO MS.
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