Era uma vez
um homem que possuía uma família numerosa, apenas ele a esposa só mais nove
filhos que ambos tinham muito cuidado com todos. Criavam um papagaio muito
falador o que era a alegria da criançada, falava de tudo mesmo, chamava as
crianças um por um pelos seus nomes, chamava os cães por seus nomes também,
atiçava os cães se passasse algum animal solto por ali, depois dava boas gargalhadas
com a bagunça que tinha provocado, muito conhecido por todos os passeantes que
por ali transitavam, era muito cobiçado pelo povo que o conhecia, mas nosso
amigo roceiro não desfazia dele por nada, por ser muito estimado da família. O
homem trabalhava na roça, como todo roceiro leva uma vida difícil no aspecto
financeiro por que só nas colheitas é que aparece algum dinheiro. Lá de vez em
quando trabalhava alugado para outros, para obter alguns trocados quando precisasse.
Este fazia os chamados ”Bicos” sempre que a roça lhe dava tréguas. Assim ia
vivendo, morava na beira de uma estrada de muito movimento, por ali passava de
tudo principalmente em épocas de safras, eram caminhões carregados de algodão,
milho feijão, arroz, café enfim, de tudo o que era cultivado na região cujo
escoamento era aquela estrada que dava acesso as maiores cidades e centros
comerciais. Ali passavam também cargueiros, cavaleiros, gente á pé também,
tropas, boiadas carroções e carroças diversas cada uma com o que transportava
em pequena escala. Num dia desses passou uma boiada, muitas reses que vinha de
muito longe, bastante o número de peões que a conduziam pelo estradão. Depois
de três dias que a boiada passou, apareceu uma vaca que por estar cansada da
longa viagem, vinha arrastando os cascos como é dito pelo sertanejo, tinha
ficado na “arribada”, quer dizer, lá atrás do rebanho que não conseguira
acompanhar na marcha por sentir muito cansaço. Era um sábado já de tarde. O
roceiro deu por fé da vaca porque o louro viu-a primeiro e atiçou os cães nela,
a pobre vaca não pode correr por estar entregue ao cansaço, O homem ralhou com
os cães e tangeu-a para o terreiro, deu agua para ela beber, estava com sede
mesmo, sorveu o liquido e depois ele ficou olhando a vaca, estava boa de carne,
apenas cansada! Teve uma ideia, tocou ela para os fundos de sua casa e
amarrou-a pelo pescoço num pé de laranjas para que ela deitasse e descansasse
melhor. Logo ao anoitecer, após as crianças dormirem ele foi num dos quartos da
casa e confidenciou com a esposa! Ana, vamos matar esta vaca para nós comer a
carne, dará para uns três meses, no mínimo. Vamos tomar porre, o que você acha?
A mulher objetou: Será que ninguém não virá atrás dela? De repente vem alguém e
daí? O marido pensou e disse: Vamos matá-la no capão, deixaremos a carne
secando num estaleiro bem alto, lá mesmo e só teremos que cuidar os urubus.
Depois traremos para a casa e esconderemos o couro detrás da porta. Ensacarei a
carne seca, porei no fundo do galpão e ninguém saberá! A Ana concordou! Era
boca da noite este diálogo, as crianças já estavam dormindo mas eles se
esqueceram do louro que ouvira tudo lá do seu poleiro enquanto coçava os
piolhos e lubrificava as penas, enfiou a cabeça por cima das asas e dormiu. Na
madrugada de Domingo, o homem tangeu a vaca para o lugar, e mataram-na. Fizeram
tudo certinho, conforme planejaram! Deu tudo certo! Dalí há quatro dias
apareceu um peão que de volta a procura de algum “arribado”, passou lá na estrada, nem chegou, só falou bom dia.
Continuou estrada afora em sentido contrário ao que ajudara a conduzir a
manada. De tarde lá vem o peão sem nada e sem esperanças de encontrar a tal
vaca. Parou e perguntou ao homem: Já faz quatro dias que passamos por aqui com
um gado, por acaso o senhor não viu uma vaca preta da paleta branca passando
por aqui sozinha, ficou na “arribada”? Já andei tanto e não consegui encontrá-la?
Vim nas batidas dela mas logo ali perdi o seu rastro. A mulher, a Ana assistindo
a conversa estava com o coração nas mãos de tanto medo, daquilo dar uma
encrenca para eles. Mas o marido era um cara de pau daqueles de encomenda. Não,
não senhor! Não vi nenhuma vaca passar por aqui! Deve ter ficado em outro
lugar, lá mais para trás, aqui não! O boiadeiro até se conformara com a
informação do homem, já ia embora quando o papagaio aprontou a dele: Que nada,
boiadeiro! Dissera o louro! Ele matou sua vaca lá no capão, secou a carne lá
mesmo, trouxe para casa está na dispensa ensacada, para ninguém descobrir! O
couro está enrolado atrás da porta! Olha lá para o senhor ver, se não é
verdade? O pobre homem e a mulher ficaram de cara no chão sem articular uma
palavra! Morrendo de vergonha, mas foram obrigados a confirmar a versão do
louro ante o ocorrido! O boiadeiro por sua vez, viu aquela família, com tantos
filhos, onze ao todo; vendo aquela casinha humilde, pobre, o rosto do homem que
mostrava ser sofrido de trabalhar e lutar por aquele monte de crianças correndo
no terreiro a mulher com as vestes simples e desgastadas sentiu pena e disse:
Me traz apenas o couro, para mim recortar a marca dela e levá-la ao patrão, direi a ele que
achei-a morta. Entre nós não haverá problemas, pode ficar descansado! Só tenha
cuidado com o seu louro! Ele te dará muitos! Pediu agua tomou, se despediu e
foi embora. O homem ficou com tanta raiva do louro que nem fez nada naquela
hora. Ficou imaginando como faria para matá-lo, como judiaria daquele
linguarudo para descontar aquela vergonha que tinham passado! Papagaio filho de
uma P..... Filho daquela outra, filho de nem sei quem mais. Bicho infeliz, imundo! Há, se eu te pego! Nem
sei onde estou agora, que não te estrangulo! Vais me pagar caro! Imundície!
Despejou mais um monte de impropérios ao louro, que se xingo matasse, cairia
duro no chão naquela hora! A Ana vendo a ira que o marido estava do louro,
disse: O bicho não tem culpa! Culpado fomos nós, que fizemos errado! Você ainda
defende esta peste de bicho! Retrucou o homem, ele tem mais é que morrer! Deixe
estar, ele não perde por esperar! Naquela noite o homem custou dormir de tão
apreensivo que estava! Pensava na vergonha que tinha passado, nunca acontecera
em sua vida uma coisa daquelas. Na forma como o boiadeiro teve compaixão de sua
família, principalmente das crianças dele, mas acreditava no boiadeiro que nada
falaria do episódio. Por fim dormiu, o louro amanheceu bem como sempre,
cantando e aprontando sua barulheira! Já aproximava o mês de junho, o tempo já
estava esfriando aos poucos, numa tarde choveu e esfriou mesmo. O homem teve
uma ideia, Ah! ja sei! Na tarde seguinte
estava frio pra burro, pegou o louro sem que a esposa visse e saiu com ele
embaixo do braço. Subiu lá para o espigão, bem na croa mesmo. Arrancando-lhe
todas as penas, a ave começou a tremer de frio. Ele todo feliz por vingar do
ultraje que sofrera, deixou-o naquele frio terrível. Falou para o papagaio:
Isto é porque você falou da vaca, seu linguarudo. Começou a garoar, imagine um
frio com garoa e aquele ventinho assoprando, era de cortar a pele da gente, o
bicho ficaria duro, enrijecido em pouco tempo, além de ter que passar a noite
inteira naquela situação! Deixou-o lá na
cabeça de um toco á beira da estrada. O bicho encolhido e louco de frio, estava
encarangado a não poder nem se mexer
mais. Foi embora o amigo nosso todo feliz. Já estava quase anoitecendo quando
lá ao longe o louro avistou um homem que vinha naquela direção, só que estava
nu por completo, era um andarilho, estava só com a roupa do corpo, para não
molhar na garoa, tirou-a toda e fazendo uma trouxinha, enfiou debaixo do chapéu
de jeito que não molharia. Não tinha ninguém mesmo que o visse para sentir
vergonha. Foi passando por ali peladinho como nasceu, nem veria o louro na
cabeça do toco, se este não lhe perguntasse: Você também falou da “vaca”? O
andarilho tomou um susto vendo o papagaio pelado, sem uma pena sequer e
respondeu: Porque louro? Porque tu tá pelado também! O meu dono me deixou aqui
pelado deste jeito por que falei da “vaca”. Pensei que você fosse mais um
linguarudo que tivesse falado da vaca também!
ESTE CONTO É
MAIS UM QUE OS CABOCLOS CONTAM.
CULTURA
SERTANISTA QUE PASSA DE GERAÇÃO EM GERAÇÃO
ESCRITO E REPRODUZIDO POR LUIZÃO-O-CHAVES.
LUIZÃO-O-CHAVES. ANASTÁCIO MS 26/11/2013
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