sábado, 30 de novembro de 2013

O BOIADEIRO E O PAPAGAIO






Era uma vez um homem que possuía uma família numerosa, apenas ele a esposa só mais nove filhos que ambos tinham muito cuidado com todos. Criavam um papagaio muito falador o que era a alegria da criançada, falava de tudo mesmo, chamava as crianças um por um pelos seus nomes, chamava os cães por seus nomes também, atiçava os cães se passasse algum animal solto por ali, depois dava boas gargalhadas com a bagunça que tinha provocado, muito conhecido por todos os passeantes que por ali transitavam, era muito cobiçado pelo povo que o conhecia, mas nosso amigo roceiro não desfazia dele por nada, por ser muito estimado da família. O homem trabalhava na roça, como todo roceiro leva uma vida difícil no aspecto financeiro por que só nas colheitas é que aparece algum dinheiro. Lá de vez em quando trabalhava alugado para outros, para obter alguns trocados quando precisasse. Este fazia os chamados ”Bicos” sempre que a roça lhe dava tréguas. Assim ia vivendo, morava na beira de uma estrada de muito movimento, por ali passava de tudo principalmente em épocas de safras, eram caminhões carregados de algodão, milho feijão, arroz, café enfim, de tudo o que era cultivado na região cujo escoamento era aquela estrada que dava acesso as maiores cidades e centros comerciais. Ali passavam também cargueiros, cavaleiros, gente á pé também, tropas, boiadas carroções e carroças diversas cada uma com o que transportava em pequena escala. Num dia desses passou uma boiada, muitas reses que vinha de muito longe, bastante o número de peões que a conduziam pelo estradão. Depois de três dias que a boiada passou, apareceu uma vaca que por estar cansada da longa viagem, vinha arrastando os cascos como é dito pelo sertanejo, tinha ficado na “arribada”, quer dizer, lá atrás do rebanho que não conseguira acompanhar na marcha por sentir muito cansaço. Era um sábado já de tarde. O roceiro deu por fé da vaca porque o louro viu-a primeiro e atiçou os cães nela, a pobre vaca não pode correr por estar entregue ao cansaço, O homem ralhou com os cães e tangeu-a para o terreiro, deu agua para ela beber, estava com sede mesmo, sorveu o liquido e depois ele ficou olhando a vaca, estava boa de carne, apenas cansada! Teve uma ideia, tocou ela para os fundos de sua casa e amarrou-a pelo pescoço num pé de laranjas para que ela deitasse e descansasse melhor. Logo ao anoitecer, após as crianças dormirem ele foi num dos quartos da casa e confidenciou com a esposa! Ana, vamos matar esta vaca para nós comer a carne, dará para uns três meses, no mínimo. Vamos tomar porre, o que você acha? A mulher objetou: Será que ninguém não virá atrás dela? De repente vem alguém e daí? O marido pensou e disse: Vamos matá-la no capão, deixaremos a carne secando num estaleiro bem alto, lá mesmo e só teremos que cuidar os urubus. Depois traremos para a casa e esconderemos o couro detrás da porta. Ensacarei a carne seca, porei no fundo do galpão e ninguém saberá! A Ana concordou! Era boca da noite este diálogo, as crianças já estavam dormindo mas eles se esqueceram do louro que ouvira tudo lá do seu poleiro enquanto coçava os piolhos e lubrificava as penas, enfiou a cabeça por cima das asas e dormiu. Na madrugada de Domingo, o homem tangeu a vaca para o lugar, e mataram-na. Fizeram tudo certinho, conforme planejaram! Deu tudo certo! Dalí há quatro dias apareceu um peão que de volta a procura de algum “arribado”, passou  lá na estrada, nem chegou, só falou bom dia. Continuou estrada afora em sentido contrário ao que ajudara a conduzir a manada. De tarde lá vem o peão sem nada e sem esperanças de encontrar a tal vaca. Parou e perguntou ao homem: Já faz quatro dias que passamos por aqui com um gado, por acaso o senhor não viu uma vaca preta da paleta branca passando por aqui sozinha, ficou na “arribada”? Já andei tanto e não consegui encontrá-la? Vim nas batidas dela mas logo ali perdi o seu rastro. A mulher, a Ana assistindo a conversa estava com o coração nas mãos de tanto medo, daquilo dar uma encrenca para eles. Mas o marido era um cara de pau daqueles de encomenda. Não, não senhor! Não vi nenhuma vaca passar por aqui! Deve ter ficado em outro lugar, lá mais para trás, aqui não! O boiadeiro até se conformara com a informação do homem, já ia embora quando o papagaio aprontou a dele: Que nada, boiadeiro! Dissera o louro! Ele matou sua vaca lá no capão, secou a carne lá mesmo, trouxe para casa está na dispensa ensacada, para ninguém descobrir! O couro está enrolado atrás da porta! Olha lá para o senhor ver, se não é verdade? O pobre homem e a mulher ficaram de cara no chão sem articular uma palavra! Morrendo de vergonha, mas foram obrigados a confirmar a versão do louro ante o ocorrido! O boiadeiro por sua vez, viu aquela família, com tantos filhos, onze ao todo; vendo aquela casinha humilde, pobre, o rosto do homem que mostrava ser sofrido de trabalhar e lutar por aquele monte de crianças correndo no terreiro a mulher com as vestes simples e desgastadas sentiu pena e disse: Me traz apenas o couro, para mim recortar a marca  dela e levá-la ao patrão, direi a ele que achei-a morta. Entre nós não haverá problemas, pode ficar descansado! Só tenha cuidado com o seu louro! Ele te dará muitos! Pediu agua tomou, se despediu e foi embora. O homem ficou com tanta raiva do louro que nem fez nada naquela hora. Ficou imaginando como faria para matá-lo, como judiaria daquele linguarudo para descontar aquela vergonha que tinham passado! Papagaio filho de uma P..... Filho daquela outra, filho de nem sei quem mais.  Bicho infeliz, imundo! Há, se eu te pego! Nem sei onde estou agora, que não te estrangulo! Vais me pagar caro! Imundície! Despejou mais um monte de impropérios ao louro, que se xingo matasse, cairia duro no chão naquela hora! A Ana vendo a ira que o marido estava do louro, disse: O bicho não tem culpa! Culpado fomos nós, que fizemos errado! Você ainda defende esta peste de bicho! Retrucou o homem, ele tem mais é que morrer! Deixe estar, ele não perde por esperar! Naquela noite o homem custou dormir de tão apreensivo que estava! Pensava na vergonha que tinha passado, nunca acontecera em sua vida uma coisa daquelas. Na forma como o boiadeiro teve compaixão de sua família, principalmente das crianças dele, mas acreditava no boiadeiro que nada falaria do episódio. Por fim dormiu, o louro amanheceu bem como sempre, cantando e aprontando sua barulheira! Já aproximava o mês de junho, o tempo já estava esfriando aos poucos, numa tarde choveu e esfriou mesmo. O homem teve uma ideia, Ah!  ja sei! Na tarde seguinte estava frio pra burro, pegou o louro sem que a esposa visse e saiu com ele embaixo do braço. Subiu lá para o espigão, bem na croa mesmo. Arrancando-lhe todas as penas, a ave começou a tremer de frio. Ele todo feliz por vingar do ultraje que sofrera, deixou-o naquele frio terrível. Falou para o papagaio: Isto é porque você falou da vaca, seu linguarudo. Começou a garoar, imagine um frio com garoa e aquele ventinho assoprando, era de cortar a pele da gente, o bicho ficaria duro, enrijecido em pouco tempo, além de ter que passar a noite inteira naquela situação! Deixou-o lá  na cabeça de um toco á beira da estrada. O bicho encolhido e louco de frio, estava  encarangado a não poder nem se mexer mais. Foi embora o amigo nosso todo feliz. Já estava quase anoitecendo quando lá ao longe o louro avistou um homem que vinha naquela direção, só que estava nu por completo, era um andarilho, estava só com a roupa do corpo, para não molhar na garoa, tirou-a toda e fazendo uma trouxinha, enfiou debaixo do chapéu de jeito que não molharia. Não tinha ninguém mesmo que o visse para sentir vergonha. Foi passando por ali peladinho como nasceu, nem veria o louro na cabeça do toco, se este não lhe perguntasse: Você também falou da “vaca”? O andarilho tomou um susto vendo o papagaio pelado, sem uma pena sequer e respondeu: Porque louro? Porque tu tá pelado também! O meu dono me deixou aqui pelado deste jeito por que falei da “vaca”. Pensei que você fosse mais um linguarudo que tivesse falado da vaca também!

ESTE CONTO É MAIS UM QUE OS CABOCLOS CONTAM.
CULTURA SERTANISTA QUE PASSA DE GERAÇÃO EM GERAÇÃO
ESCRITO E REPRODUZIDO POR LUIZÃO-O-CHAVES. 
LUIZÃO-O-CHAVES.    ANASTÁCIO MS     26/11/2013



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