Nos seringais do Amazonas
e Pará trabalhavam vários seringueiros, cada um tinha sua área de atuação
demarcada, divisada e dividida em forma de lotes, um para cada pessoa que no caso
trabalha solitário. Sozinho no seu acampamento ou barraco. As divisas de cada
um lindeiro do outro é apenas um picada ou uma trilha, demarcada por um marco
rústico em cada ângulo ou em parte um curso d’agua. Exemplo a minha área e de dez hectares em quadro.
Nós os seringueiros só trabalhamos á noite colhendo o látex. Saímos do barraco
ou rancho de folhas de coqueiro já no escurecer, levamos matula, armas até
certo ponto muito boa, um facão de mato, um lampião de luz incandescente,
antigamente os lampiões eram os Petromax de 500 velas que funcionavam á
querosene, a sua luminosidade era tão perfeita e precisa que afugentava
qualquer animal noturno de seu clarão, levamos também uma cabaça de agua, bem
vestidos e calçados e muito atentos, porque a selva nunca deixa de ser perigosa
e surpreendente, a beira de rios também é cheia de surpresas. Só não
trabalhamos em tempos de chuvaradas. Entre os seringueiros existe uma senha,
por causa de cada um estar solitário no seu rancho que é muito bem feito e
seguro. A selva tem muitos animais que vivem em bandos, porcos queixadas,
caititus, caboclinhos d’agua na beira dos rios, onças, outros desconhecidos que
podem até atacar o acampamento com a gente dentro. Ao sair para o trabalho
fazemos um disparo para que o ribombar da arma seja ouvido por todos os demais
companheiros espalhados. Ao retornarmos no dia seguinte no amanhecer fazemos o
mesmo ao chegarmos no barraco, isto sinaliza que estamos vivos e que tudo está em ordem. Caso algum não
fizer isto, a senha falhando é sinal que alguma coisa aconteceu, um dos
companheiros pode ter adoecido ou estar morto, de imediato o mais próximo vai
ver e avisa os outros, logo vão ver o que houve de anormal. Serviço muito
perigoso e arriscado para todos que nela trabalham, a selva é sempre infestada
de perigos e bichos que nem os conhecemos direito, mas a nossa união ameniza a
situação. Insetos noturnos e venenosos, cobras, ou serpentes desconhecidas,
animais ferozes diversos etc. Certa ocasião dois deles e vizinhos de lote após a
semana de trabalho árduo resolveram descansarem na noite de sábado, para no
domingo cedo irem dar uma caçada durante o dia. Cedinho saíram para a mata,
andaram longe muito longe e nada encontraram, ao chegarem numa clareira um
disse ao outro: Você segue nesta direção sempre na esquerda e eu sigo aqui na
direita em linha reta, a nossa rota é paralela, se algum bicho fugir de mim
dará de cara contigo e mataremos, ou vice-versa. Basta abatermos um, já é
suficiente e voltaremos para casa. Combinado, e de quando em quando darei um
grito para que saiba onde estou, e você responderá. Tudo acertado lá se foram
muito atentos. Apesar de terem andado muito, caça nenhuma viram. Um deles se
chamava Tomaz e o outro atendia por Pio, passado um tempo, este derradeiro
pensou: Acho que já esta na hora da gente reencontrar, resolveu dar um grito e
chamar o companheiro e ver se não estavam muito longe um do outro. Gritou bem
alto: Ô Tomaz! Não obteve resposta nenhuma, esperou mais um pouco escutou, e
nada! Gritou de novo e mais forte, seu grito ecoou na mata e nada de resposta.
Ficou apreensivo, deu mais um grito e escutou muito longe a resposta do
companheiro, marcou a direção e rompeu no mato logo adiante repetiu o grito,
obteve nova resposta e desta vez bem mais perto, mas estranhou o grito, era
rouco, diferente porque ouviu bem: Ô Tomaz! Como resposta. Teve certeza que não
era o Tomaz que respondera ou ele estaria brincando consigo, e remendando do mesmo
jeito. Porque Tomaz era ele e não tinha
outro. Esperou uns minutos mais e pela quinta vez tentou desfazer aquela que
parecia ser brincadeira ou outra coisa séria, esquisita. Deu o grito e teve
como resposta o mesmo, teve um pressentimento ruim e sentiu até um pavor com
aquela voz feia e agora bem mais perto, pensou: Isto não está certo. Olhou para
um arvoredo de caule fino e subiu nele, nem acabou de empoleirar-se ouviu de
novo: Ô Tomaz! Agora bem pertinho, calou e ficou encolhido que nem suspirava
para não fazer barulho, ouviu algo rasgando os arbustos no mato vindo em sua
direção. Permaneceu quieto e o barulho aproximando cada vez mais, os ramos e os
arbustos movendo, até que surgiu uma coisa horrenda, um bicho que parecia ser
de outro mundo de tão feio e com o seu amigo o Tomaz embaixo do braço,
levando-o de arrasto como se dá uma gravata no adversário numa luta. O Tomaz
estava Morto! O bicho o pegara! Era uma fera na forma de um crocodilo ou
jacaré: Cabeça, mãos, e braços de humano, a boca era de jacaré, olhos saltados
e vermelhos, com orelhas em abano, o corpo era cascudo, pernas, pés e rabo
igual crocodilos, mas andando em pé como gente, parou apoiado no rabo
estendido. O Pio ficou petrificado vendo aquilo, não teve coragem de atirar
naquele expectro. O bicho parou, olhou ao redor como que procurando algo, tomou
faro mas este não lhe é facultado, gritou: Ô Tomaz! Deu um enorme eco na mata!
Olhou para o morto, deu-lhe um piparote na cabeça esmagando-a, retirou os
miolos do amigo e comeu-os dizendo: Deste Tomaz, tomara ter mais! Saiu andando mato
afora e gritando: Ô Tomaz! O Pio esperou uma hora até que não ouvia aquela voz
horrenda. Desceu e foi-se embora, chegou no barraco ainda assombrado, não deu a
senha para os outros seringueiros, não atirou. Sem muita demora os vizinhos
vieram até ele. Contou-lhes toda a história, e descobriram o porquê do sumiço
de alguns companheiros há algum tempo. Seria este monstro que os matou? Com
certeza foi ele. Por três dias ninguém arriscou ir trabalhar, foram á cidade
trouxeram uma patrulha do exercito com arma especial que na companhia do Pio
vasculharam a região gritando sempre: Ô Tomaz! De repente ouviram a resposta da
fera, gritaram de novo e bem alto, após terem subido numa árvore. Não demorou
muito escutaram novamente a resposta do bicho, vinha repetindo sempre. Ô Tomaz!
Chegou no lugar onde os nossos amigos
estavam camuflados na árvore, parou sondou, desconfiou parece que seu instinto
feroz lhe avisava que por ali tinha humanos. Um dos patrulheiros fez movimento
no galho onde estava e o bicho olhou para cima, vendo-os abriu a bocarra e
esturrou! Um dos rapazes que já havia ouvido falar desta fera pensou: É o
homem-crocodilo! Apontou a arma bem na rodela do umbigo da fera onde não tinha
casca e disparou sem piedade. O monstro deu um salto para cima e caiu,
estrebuchando, roncava, e se debatia, logo quietou sem vida. Desceram, olharam
admirados daquela coisa esquisita, fotografaram e concluíram: Agora acabou o
sumiço dos trabalhadores. Para nossa sorte estas feras quase não proliferam.
Era mesmo outra espécie de Capelobo, muito rara mesmo! O Homem-Crocodilo da
Amazônia!
CONTOS IMAGINÁRIOS DE
CABOCLOS SERTANEJOS PARA O NOSSO FOLCLORE 22/08/2015
NOSSO BLOGGER “COISAS DE
CABOCLO DE LUIZÃO-O-CHAVES”.
ANASTACIO, MS 18/08/2015
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