Numa tarde dessas o”Seu”Quintino,
um antigo morador da fazenda “Buracão” nas proximidades da mata assombrada, do
lado de cá da cordilheira numa furna e
hábil caçador e “Esperador” de caças nas matas da furna, muito famoso e
admirado por suas façanhas, coragem e feitos notáveis resolveu ir esperar uma
caça naquela tarde de sexta-feira, não importava o que saísse, fosse anta,
veado, caititu, ou outro bicho qualquer que descesse do alto da serra para a
furna, onde a mata era fechada, fresquinha, bonita e sombria, tinha um córrego
e muitas fruteiras onde os bichos se fartavam de comerem. Lugar excelente, ponto
de uma estratégia que não falhava, as caças caiam mesmo em suas artimanhas,
sabia esperar com uma técnica invejável, um hábil, engenhoso profissional nesta
arte. O homem entendia mesmo do assunto. Como sabemos que o mês de Agosto
costuma ser um período do ano que as pastagens e a alimentação dos animais
escasseiam muito, e a estiagem ás vezes se estende por mais uns dias até o mês
de Setembro que quando o ano é bom, chove logo no inicio do mês e ai toda a
relva, mata, campos e cerrados reverdece dando uma nova forma de vida á tudo.
Mas enquanto isso não acontece, e a chuvarada demora, os bichos procuram as
furnas onde sempre tem o que comer, por ter quase de todas as frutas e raízes
que os animais e aves silvestres se alimentam. Eram umas três e meia da tarde!
O velho caçador dissera a sua esposa: Conceição, estou com um palpite de matar
um bicho esta tarde, faz dias que não caço e nem espero, por estar muito ocupado
na roça. Mas hoje roubei um tempinho e da roça subi lá e vi, como tão saindo,
descendo a serra, e indo para a furninha, vou buscar um bicho para nós. Hoje é
meu dia! Trago uma caça nem que seja de arrasto pelo rabo, kkkkkkkkk. Deixa
disso Quintino, retrucou a esposa! Hoje não é dia de caçar e muito menos
esperar, deixe os bichos em paz, além de ser o mês de Agosto, o dia de hoje da
semana costuma ser aziago, impróprio para isso. Em muitos casos as caças nem
saem com a frequência como você está pensando. Elas tem o seu dono, e as leis
que obedecem. As caças e as matas tem certos dias que são misteriosas e muita
gente que caça não sabe. É bom ter cuidados! Que nada mulher, vou te mostrar
que mato elas qualquer dia da semana, comigo não tem nada disso! Caça não tem
querer lá na furninha estão saindo de dia, tem muita fruta caindo, o chão está
forrado e pisoteado delas, andam famintas, passei por lá e vi! O carreiro está
poido, e fundo de tão batido de tudo que é bicho. Vou matar o que sair
primeiro, pegou a cartucheira de dois canos, o sapicuá de munição, uma
cabacinha de agua e o facão. E foi todo garboso. De fato o carreiro de descida que
passava por uma garganta da serra parecia corredor de gado, porque de um lado e
de outro era um paredão enorme de alto, a bicharada tinha que passar só por ali
naquele desfiladeiro. Chegando lá no lugar que achou ideal, viu um pé de
Pateiro que tinha galhos frondosos e bem ocultos por suas folhagens e que davam
sombra bem no carreiro, trepando numa forquilha com um terceiro braço e se
acomodou lá em cima, era um antigo jirau, o vento leve que tangia as folhagens
da mata era suave e abanava do alto do morro para a furna. As caças não lhe
sentiriam, ficou quietinho lá no alto. Não demorou muito lá vinha dois veados,
um pequeno na frente e outro grande mais atrás. Como caçadores são gulosos,
pensou consigo: Este grandão tá no papo, deixou o pequeno passar embaixo do seu
jirau, e empunhou a cartucheira engatilhou um dos canos e fez pontaria no veado
grande, no capricho. Dormiu na mira, acompanhou o andar do baita bicho, firmou
o ponto na volta da paleta, coçou o dedo no gatilho e: TIBUM! A fumaceira da
pólvora cobriu tudo, mas a brisa suave dissipou tudo muito rápido. Quintino
muito animado e certo de ter abatido o veado pois sempre fora bom atirador
tomou um susto que quase caí para trás, ao ver os dois bichos em pé um olhando
para o outro, sem ter um arranhão, nem ter caído sequer um fiapo de pelo, e
ainda o veadinho pequeno olhou para trás como se procurasse a direção de onde
tinha ouvido o estrondo do tiro, falou para o outro: Este tiro acertou em você
Tomé? O veado grande respondeu: Em mim não! O veadinho pequeno replicou: Pensei
que tivessem atirado em você que tá aí atrás e é grandão. Ah! se te acertam
este tiro, veria que dor desgraçada tu ia sentir. O velho Quintino ouvindo a
conversa entre os dois pensou consigo: Esperem aí que vou fazê-los calarem a
boca. Engatilhou o outro cano da bocuda e mandou ver de novo, errei o primeiro,
mas o segundo jamais. TIBUM!!! De novo a fumaça cobriu tudo! O veadinho pequeno
deu uma baita gargalhada depois de um salto de lado após o disparo. Perguntou
de novo: E este outro tiro lhe pegou Tomé? Também não me acertou! O veadinho
olhou para cima e viu o velho Quintino da cor de uma flor de algodão de pálido
e tremendo de tanto medo e susto. Nunca ouvira falar dum negocio deste. Caiu na
realidade, sentiu que a ficha caíra, bicho da mata falando igual gente? Viu que
era coisa do outro mundo! Deixou a espingarda cair das mãos e em seguida
despencou lá de cima do jirau e veio de qualquer jeito até bater no chão. O
veadinho gritou para o outro: Pegue esta “Cabra” e vamos dar um couro nele
agora. Cerca ele para não descer na furna, Quintino levantou, nem se importou
com espingarda, nem capanga de munição nem nada que tinha levado, em pânico,
apavorado subiu serra acima rasgando o mato no peito, não houve cipó
arranha-gato, nem espinheiros ou cipoal que segurasse o homem. Parou de correr
só quando chegou na sua casa com um palmo de língua de fora e as pernas bambas
de tanto correr. Chegou a sujar toda a roupa. Kkkkkkkkkk. No dia seguinte
voltou lá para buscar a espingarda na companhia de seus dois compadres. Não encontraram
nenhum rastro, nem batida de nenhuma caça naquele carreiro e nem embaixo do seu
jirau não havia sinal de nenhum bicho e muito menos dos dois veados. Voltaram arrepiados e dizendo: Isso foi uma
“Visagem” compadre! Que assombram caçadores quando perseguem muito as caças em
dias nefastos. O senhor teimou com a comadre, olhe aí no que deu! Foi o dia da
caça! Era o dia delas! Não era dia do caçador! Nunca mais Quintino caçou, e
muito menos esperou caça na furninha!
SÃO HISTÓRIAS E CONTOS DE
CAÇADORES QUE CABOCLOS CONTAM PARA OS OUTROS.
MAIS UM CONTO PARA
ENRIQUECER O NOSSO FOLCLORE QUE É DIA 22 DE AGOSTO.
“COISAS DE CABOCLO DE
LUIZÃO-O-CHAVES” ANASTACIO, MS 16/08/2015
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