O Coelho que sempre vivera trabalhando só no
pesado e nas roças, pois a “Era” só beneficiava os que desta faziam sua
profissão, lavrador, agricultor, colonos ou roceiros como queiram. De um modo
geral eram todos os animais que lutavam pela sobrevivência neste ramo. Era
divertido até, mas cansativo também para todos, com o decorrer dos anos. O Carneiro
sendo um exemplo lidava só com lãs, tosquiava os demais, lavava as lãs, fazia
baixeiros, cobertores e vestimentas diversas, O Cabrito vendia leite e queijo
de cabras, esfolava as peles e trocava-as por outras coisas. Dos chifres dos
bodes velhos faziam cachimbos, e “Tabaqueiro”, ou “Cornicho” para os antigos
tomarem um“Torrado.” De quando em quando uma “Narigada” kkkkkkkkk. O Cavalo, o
Burro e o Boi serviam quem precisasse transportando cargas, no lombo, em
cangalhas, cargueiros ou carretas, carroças e carros de bois. O Jumento tinha
mais regalias, só informava as horas com muita precisão, é como se fosse um relógio
da Matriz. Quando abria o par de queixos zurrando, todos já sabiam que a hora
era exata. Mas quem cuidava destes era o Saci-Pererê com muito esmero,
cuidadoso como só ele sabe ser, dava-lhes banho e tosava as crinas, para
vender, sempre que podia aos que se serviam dos préstimos destes animais,
exigia em troca alguma coisa assim como: Fumo para o seu Pito, lá de vez em
quando uma cachacinha. O Caipora tinha também sua roça, só plantava fumo, fazia
cada rolo deste tamanho na época das colheitas das folhas maduras. Ficava horas
e horas sentado num toco baforando o seu
charuto, e vendo a fumaça subir. Negociava com o Gambá, fumo a troco de
cachaça. O Cachorro sempre trabalhava de vigia. O Macaco tinha um bananal que
só vendo o tamanho da roça. O Gato prestava seus serviços caçando ratos nas
“Tuias” de mantimentos, porque estragavam as mercadorias em estoque. O Caititu
plantava abóboras, batatas, cará, inhames e mandiocas. A dona Raposa vendia
galinhas, patos, marrecos, angolas, e aves diversas, sempre gostou destas
criações. O Gambá cultivava uma roça de cana de açúcar, pois herdara de seus antepassados
um engenho que nele fabricava rapaduras e melado, um alambique que destilava
álcool e cachaça, fabricava também outras bebidas. Negociava com a Raposa frangos
em troca de cachaça, pois gostava muito de uma cabeça e pescoço de frango bem
caprichado. O Peru vigiava para a Raposa, as suas criações do ataque dos
gaviões, acauã, caburés, corujões João- Curutú á noite querendo pegar as aves
no poleiro. Para isso dispunha de uma espingarda “Pica-pau” daquelas que
carrega pela boca do cano, raspava taboca, fazia buchas, derretia chumbo
fazendo “balotes”, além dos chumbos “Cabeça de macacos” e “Chumbinhos
mostardas” era farta munição. A Paca cultivava milho e feijões, o rasteiro e o
de cordas. O Tatú era vagabundo, vivia fazendo buracos por aí a esmo. Os
animais grandes precisavam tomar cuidados para não quebrarem a pata em buracos
que ele fazia. Sondava as galinhas da Raposa quando estavam chocas, para comer
a noite os seus ovos no ninho. O Lagarto Teiú também vadiava o tempo todo,
salvo um dia ou outro, vendia uns vidrinhos de mel de abelhas deste “tamaninho”
assim, para pingar nos olhos como se fora colírio, para curar cegueira. Vendia
uma “Banha” que só ele sabia onde encontrar, diz que curava picadas de
cobras. A Cutia roubava mandiocas do Caititu, e milho
de sua prima Paca para assá-las de noite. O Porco se encarregava de arar as terras e
gradeá-las para a bicharada cultivar seus plantios em épocas certas. A Capivara
vivia o tempo todo só tomando banho, não tinha o que fazer. Saia tarde da noite
nas roças alheias para fazer danos, pastar suas plantações. Além de feia,
preguiçosa, arrastando o “bucho” no chão. Mas falando do Coelho, este sentindo cansado
daquela vida monótona, pouco dinheiro, porque na maioria dos negócios se
constituía em barganhas de mercadorias entre os comerciantes, resolveu mudar de
profissão. Queria ser fotógrafo e desenhista de paisagens ou pessoas, bichos de
toda a espécie. Desde pequeno levava jeito para isso, ficava horas e horas
admirando as paisagens, as serras, o céu azul, o tempo levantando e preparando
para chover, as trovoadas, a chuva caindo, os raios quando riscavam o espaço,
dando aquele estrondo quando atingiam a terra ou árvores, as tempestades, o
arco-celeste, os ventos, o luar quando era noite, as estrelas cadentes,
assistia o amanhecer, do crepúsculo as cores que o sol poente coloria o céu. Tudo
isso lhe fascinava. Tinha vontade de colocar num quadro ou retrato estas coisas
que achava bonitas e que a natureza criara. Ser um artista era o seu sonho. Um
dia decidiu a vida. Vendeu e trocou por material de pintura e o que fosse
necessário para um começo da nova profissão a sua quitanda de frutas e verduras
e os legumes. Organizou tudo conforme planejara. Lá numa travessia da estrada
com o córrego e uma parte que dava para um alagado quando o córrego enchia em
épocas de chuvaradas. Lugar aprazível, todos os bichos teriam que passar por
ali, todos os dias da semana principalmente nos sábados, feriados e dias santos
de guarda. Construiu um barracão grande, e dentro o seu ateliê, terreiro amplo,
algumas pedras grandes por ser beira de córrego, alguns troncos de ipê deitado
com galhos secos. Plantou algumas flores de diversas qualidades para fazer
fundo nos seus retratos e quadros de paisagem. Desviou por meio de um “Rego
d’agua” um filete do córrego lá bem em cima, veio serpenteando conforme o
acidente do terreno, passando por ali como se fosse uma enxurrada, mas
permanente! Cresceu muitas samambaias, chapéu-de-couro, açucenas e outras
plantas aquáticas, ficou muito bonito. Lá no fundo virou um brejo onde logo se
criou muitos sapos, ao redor do seu barraco, plantou diversas árvores para
fazer sombras sem esquecer que algumas ao seu tempo dariam frutas. Inspirado
nelas formou no quintal um belo pomar com frutas de toda espécie e qualidades. Olha,
ficou uma beleza de lugar, do jeito que sonhara há algum tempo, já andava
imaginando que faria fortuna com a nova profissão dentro em breve. Mas por
enquanto eram apenas sonhos, vamos esperar para mais tarde, quem sabe! Tendo em
mãos tudo o que precisava para iniciar, retratou algumas paisagens, desenhou a
sua casa e sua família, esposa e dois filhos, o lugar ao redor, pintou que
ficou uma maravilha. Colocou a exposição dos passeantes na beirinha da estrada
que logo perguntaram se ele fazia para vender, era isso que ele queria. Deu
certo! Bateu palmas de contentamento. O primeiro freguês apareceu, foi o “Jegue
da mata”. Dai para frente foi só sucesso. Tudo o que era bicho vinha na sua
casa ver a novidade. Nem tinha tempo para comer, só atendendo a freguesia. Tudo
transcorria as mil maravilhas. Num destes feriados prolongados, a bicharada acabou
de tomar conhecimentos daquele trabalho que o Coelho fazia. Quase todos queria
ser fotografados! O preço que o Coelho cobrava era razoável, todos poderiam
pagar sem problemas, quem não tivesse dinheiro pagava com mercadorias, gêneros
alimentícios. Até nisso ninguém se apertava. Tinha um monte de encomendas, por
lá passou o Porco com a família, pediu para ser retratados, combinaram o dia de
pagar. A Porca deitou-se e os leitõezinhos se ajeitaram para mamar, o Coelho
riscou certinho e o Porco foi-se embora. Vai o Tatú, vem a Paca, a Cutia, o
Cavalo, o Cachorro, o Gato até o Javali, cunhado do Porco, enfim todos os
bichos. Naquela manhã de sábado, aparece lá um Sapo-boi, um baita bicho. Nada
mais nada menos ele pesava uns 8 quilos. Foi fotografado também, marcou o dia
de pegar a foto, coincidia com a data do Porco, da Rãzinha e outros. Chegando a
data lá vem o anfíbio todo alegre, tinha dado um lustro nos chifres com um
monte de sapos, todos curiosos para admirarem a foto do velho Sapo-boi, decerto
pensavam: Deve ter saído muito bonita! Nós também vamos tirar. Tal não foi a
surpresa e decepção que tiveram, saiu horrível, dava até tristeza de ver
tamanha feiura, nossa Senhora que coisa! Ao apresentar a foto para o cliente o
Coelho nem imaginava a reação do freguês ao ver seu trabalho tão dificultoso
nos mínimos detalhes, saiu perfeito, nem o Coelho esperava uma coisa daquelas.
Nossa! Mas o Sapo deu um pulo para trás! Esbravejou assim: É esse o teu
trabalho? Isso é o que você faz! Cadê sua fama de fotógrafo? Porque me tratou
dessa forma? Isso é deboche com a minha cara? Tá pensando que sou trouxa? Faz
um serviço deste e ainda quer cobrar? Não aceito a foto! Pode ficar com ela!
Não pago um centavo por este serviço mal feito! Não parece nem com minha
sombra? O pobre Coelho tomou um susto que até a fala lhe fugiu. Pera aí mestre
Sapo, disse o Coelho! A foto do senhor está perfeita! O senhor deve estar
nervoso com outra coisa, meu trabalho é bem feito! Caprichei nos detalhes!
Repare bem? O Sapo alterou de novo e foi aquele bate-boca sem fim. O Porco
vinha chegando e ouviu aquele “Arranca-rabo”. A Rã e outros bichos pegaram suas
fotos e ficaram satisfeitos com o trabalho do Coelho, admiravam, elogiavam mostrando
uns para os outros. Pagavam contentes agradecendo ao Coelho. Aquilo para o Sapo-boi
foi um insulto. O Porco pegou a foto da esposa com os leitõezinhos e ficou
maravilhado. Pagou e já ia indo embora quando o Sapo-boi repetiu que o trabalho
do Coelho era um serviço “porco”. Nossa! Aí o Porco pediu-lhe explicações! Porque
é Porco ? Seu atrevido? Está me desrespeitando? Veja como fala? A sua foto está perfeita, você achou-a feia?
Deveria olhar antes num espelho e entender que você não tem beleza, és feio e
quer que a foto fique bonita? Isso não tem cabimento! Pague o Coelho e deixe de
arrumar encrenca! O Sapo inchou e veio na direção do Porco como se fosse
pegá-lo pelo gogó, este não perguntou nada: Tirou o corpo fora e deu-lhe uma
focinhada de baixo para cima naquele barrigão do Sapo que virou três
cambalhotas no ar e caiu de ponta lá longe que até amassou um dos chifres.
. Levantou
sem graça, enquanto os presentes ao verem aquilo rolavam de tantas risadas.
Bateu o pé: Não pago! Nisto foi chegando mais bichos e assistindo aquela
discussão. Por fim o Sapo-boi, desapontado, fez uma proposta para o Coelho que
reclamava ter gasto tempo e material com a foto e agora perder tudo? Tinha medo
do Sapo com aqueles chifres pontiagudos, sorte dele que o Porco deu-lhe apoio e
uma lição no Sapo que acalmou os nervos ligeirinho, então dissera ao amigo: Eu
reconheço em parte que sou errado! Tratei, tenho que pagar! Mas a foto não me
agrada, também tenho direitos, vou recorrer.
Vou pedir aos meus patrícios que aqui estão um parecer que seja justo!
Muito embora me parece que, estão meio divididos. Eram uns cento e tantos sapos,
de todos os tamanhos, uma saparia que dava até uma guerra. Afirmou, se eles
votarem a seu favor, eu pago a foto e acabamos com a contenda. Se caso votarem
ao meu favor, vou-me embora sem pagar nada, a foto fica para você. Concorda
mestre Coelho? Sim, respondeu o fotógrafo! Então vamos lá: Pedindo atenção de
todos os sapos ali presentes disse: Os que acharem que o Coelho tem razão, por
favor, fiquem á minha esquerda, aqui deste lado, apontou com o dedo! Agora os
que acharem que a razão está do meu lado, passem para este lado de cá, á minha
direita! Serão dois grupos! Contaremos um por um de cada grupo, o grupo que
contiver maior quantidade de elementos vencerá! Foi uma mistura de tantos sapos, passa para lá
e passa para cá! A bicharada que assistiu tudo, aprovou a ideia, bateram
palmas. O Coelho contou de seu lado: Deu
61. O Sapo contou do outro que eram seus: Deu 60. E agora? Empate técnico! O Coelho
vibrou de alegria! Venci, gritava eufórico! Nada disso, disse o Sapo-boi! Está
empatado meu caro! Quer ver? Chamou o dito cujo que gerou a diferença! Venha
aqui? Era um Sapo já de avançada idade. Pois não, disse ele: Ás suas ordens! O
Sapo-boi disse-lhe: O problema aqui está sendo você, terá que ir embora agora!
Você é meu parente, mas eu sou seu superior, terá que me obedecer, não esqueça
que sou chefe de todos vocês! Ouviu? O Sapo intimado passou a mão no queixo,
pestanejou, pensou uns instantes e respondeu: O senhor está muito enganado, eu
não vou á lugar nenhum, porque não estou recebendo ordens dessa natureza. Para
isso serei juiz desta causa. Para julgar esta questão ou dirimir alguma dúvida,
vão precisar de um Magistrado e eu sou formado em direito, entendo de leis, do
jeito que o senhor pensar! Só dependo da aprovação da turma aí dos dois lados!
Sou candidato único ao cargo de Juiz para esta questão. Aqui não tem nenhum
mais que se habilite! A turma nem esperou nada, aclamaram-no! Aprovado! Aprovado! Aprovado! Mais uma vez a cara do Sapo-boi cai
por terra! Voltando ao assunto, e já de posse do cargo disse agora com
autoridade: Vocês do lado direito me respondam: Apontou o dedo para o Sapo-boi
que estava bem no meio dos dois grupos dizendo: E este “PAGA” a conta? Sua
turma respondeu: NÃO PAGA! Virou para a turma do Coelho do lado esquerdo: E para
este, ele “PAGA”? A turma disse: “PAGA”! Nossa! Disse o Juiz, está empatado
ainda. Está suspensa a Audiência por hoje! Marcaremos outra, em data a ser
definida, aguardem a notificação! Até os
dias de hoje perdura a questão! “PAGA” NÃO “PAGA”. Aquele Sapo-boi que gerou a
discórdia com o Coelho, e o que se tornou Juiz, e toda saparia mais os bichos
que assistiram, morreram todos de velhos, veio uma nova geração de todos, mas a
questão continua do mesmo jeito! Ninguém mudou de lado. Continua sem solução a
causa! Quando é noite que chove e logo estia, lá no brejo se ouve até ao
amanhecer a turma dos dois lados Cantando assim: “PAGA ?” “NÃO PAGA !”
/ “PAGA ?” “NÃO PAGA !”
/ “PAGA ?” “NÃO PAGA !” Virou uma
orquestra sinfônica!!! kkkkkkkkkkkkkkkkk.
HISTÓRIAS QUE
APRENDEMOS NO CURSO DA VIDA E CONTAMOS PARA DIVERTIREM.
DA CULTURA
SERTANISTA ESTA É UMA HISTÓRIA DAS CENTENAS QUE EXISTEM.
“LUIZÃO-O-CHAVES”
E SUAS IMAGINAÇÕES.......
ANASTÁCIO MS
10/04/2014